Em vigor desde novembro do ano passado, a reforma trabalhista faz parte, ainda lentamente, das relações entre patrões e trabalhadores. A perda da validade da MP 808 e a edição de uma portaria pelo governo federal acenderam o sinal amarelo na aplicação de algumas das mudanças. Mas uma das novidades da reforma que avança mês a mês em todo o Brasil, a demissão negociada entre empregado e empresa.
Nesse tipo de rescisão, o empregado tem direito a sacar 80% do saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). E a multa do empregador sobre o saldo do Fundo cai pela metade, tendo de pagar 20%. Antes da reforma trabalhista, além da demissão unilateral por parte do empregador (com ou sem justa causa), havia somente a opção do pedido de demissão por parte do empregado, não podendo retirar nada do FGTS.
Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostram a adesão à nova modalidade de desligamento no Brasil. No Piauí, esses dados revelam que nos últimos 12 meses tivemos 78.309 de novas admissões. Em contrapartida, o número de desempregado apresenta um nível bastante elevado com 76.175. Tais índices se contabilizados refletem um déficit de 2.134, ou seja, 0,87. O cadastro acompanha o processo de admissão e de dispensa de todos os trabalhadores regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
– É uma das poucas matérias da reforma que não tem polêmica. A nova lei trouxe essa possibilidade que pode trazer uma série de vantagens. A mais importante é empregado poder, se for o caso, se livrar de uma atividade e ir em busca de outra – afirma o doutor em Direito do Trabalho pela USP Raimar Machado.
Proposta deve partir do empregado
Esta proposta de rescisão não nasceu para vir do patrão, alertam os especialistas. Quando o empregador não quiser mais os serviços do empregado, resta o caminho da demissão. Não havendo justa causa, o empregado tem direito à multa de 40% do saldo do FGTS e ao saque de 100% do Fundo, entre outros direitos. O desligamento por acordo veio para ser usado pelo trabalhador, que deve tomar a iniciativa.
– O empregado deve procurar seu gestor imediato e explicar o motivo de desejar sair e a vontade de fazer isso por meio do acordo, que agora existe na lei. É a chance de sair da empresa levando um dinheiro que pode pagar uma dívida, resolver um problema de curto prazo – afirma o advogado especialista em relações trabalhistas e previdenciárias Marcus Vinicius Freitas.
A transparência na hora de encaminhar esse pedido de acordo é fundamental. O empregado deve ser sincero, explicar os motivos que o levam a querer sair (uma proposta com melhor salário ou abrir o próprio negócio, por exemplo). A tendência do patrão aceitar é maior se ele considerar apenas a questão financeira. Logo adiante, se demitir esse funcionário sem justa causa, terá de pagar os direitos completos, sem desconto. Mas o empregador não é obrigado a aceitar o acordo e pode querer permanecer com o colaborador. Bom, aí o empregado terá de decidir: permanecer no emprego, cumprindo com suas responsabilidades, ou pedir a demissão tradicional, sem os benefícios que teria no acordo.
– De qualquer forma, é preciso fazer um alerta tanto para empregado quanto para empregador. O trabalhador que pede para sair, mesmo em acordo, não tem direito ao seguro-desemprego – destaca Raimar Machado.
Saída por acordo entre empregado e patrão
O que acontece na prática:
– O pagamento da multa de 40% será pela metade, ou seja, 20% do saldo do FGTS. O empregado só poderá sacar 80% do FGTS depositado. A empresa deve conceder um aviso prévio de, no mínimo, 15 dias. O empregado não recebe o seguro-desemprego.
Quem deve propor:
–É da conta do empregado procurar o gestor imediato, manifestar seu desejo de se desligar e propor a alternativa do comum acordo.
– Ao empregador, unilateralmente, só cabe a opção da demissão (com ou sem justa causa), onde pode ter de arcar com uma série de direitos do empregado, garantidos na CLT.
Dicas para propor a demissão por acordo sem causar conflito na empresa:
– O ideal é que essa decisão seja tomada com antecedência, sem pressa. O primeiro passo é procurar o gestor imediato, respeitando a hierarquia da empresa.
– Caso, alguns dias depois, não tenha resposta, envie um e-mail para o gestor superior, com cópia para o chefe direto. Nesse e-mail, exponha os reais motivos do desejo de sair e de optar por um acordo.
– Transparência é a regra de ouro: diga a verdade, sem desculpas. Pode ser por causa de uma proposta melhor de emprego (ainda dá a chance para uma contraproposta do patrão), o desejo de abrir um negócio, acompanhar a família em uma mudança de cidade.
– Destaque a importância de sair podendo levar 80% do FGTS e apenas 20% da multa. O dinheiro pode ser útil nessa nova fase pessoal.
– Foco em manter as portas abertas. Fazendo essa solicitação com antecedência, é possível negociar com a empresa. Ofereça-se para cumprir parte ou todo o aviso prévio, treinar o eventual substituto.
– O bom funcionário terá muito mais facilidade para esse acordo. Mostrando preocupação em não causar transtornos na sua saída, tem mais chance de sensibilizar o empregador.
E se o patrão não aceitar:
– Caberá ao trabalhador decidir se continua no cargo, cumprindo suas responsabilidades, ou se pede demissão da forma tradicional, sem sacar o FGTS.
Outras formas de desligamento
Demissão sem justa causa:
– O empregado tem direito ao pagamento da multa de 40% do saldo do FGTS e ao saque de 100% do FGTS depositado. Além disso, o empregado tem direito a aviso prévio, aviso prévio indenizado proporcional, férias e adicional constitucional de um terço e 13º salário.
– Se pedir demissão, não tem direito a sacar o FGTS.
– A empresa deve conceder um aviso prévio de, no mínimo, 30 dias, trabalhado ou indenizado (pagamento).
– O empregado tem direito a receber o seguro-desemprego.
Demissão com justa causa:
– Justa causa é ato do empregado que faz desaparecer a confiança do empregador (embriaguez, prática de jogos de azar, violação de segredo da empresa, entre outras situações graves).
– Esse ato justifica a rescisão do contrato pelo empregador sem a obrigação de pagamento de alguns direitos trabalhistas.
– Quem é demitido por justa causa não pode sacar o FGTS.
– O empregador não paga a multa de 40% sobre o valor depositado no Fundo.
– O seguro-desemprego não é concedido ao demitido por justa causa.
Pedido de demissão do empregado:
– O empregado recebe do empregador os dias trabalhados naquele mês, 13º proporcional e férias proporcionais mais um terço.
– Pode ter de pagar aviso prévio, devendo comunicar ao empregador sua intenção com 30 dias de antecedência para o aviso prévio ser trabalhado.
– Não tem direito ao saldo do FGTS, à multa de 40% sobre esse valor e ao seguro-desemprego.
Fonte: Gauchazh