O mundo está atônito com as notícias do caos gerado pela pandemia do COVID-19, que, dia após dia, vem impactando gravemente a economia, desafiando a ciência e fazendo ruir os alicerces da sociedade contemporânea e sua forma de organização.
A crise sanitária é extremamente grave e revela um cenário de total incapacidade dos países e de suas autoridades em evitar preventivamente situações como a que estamos vivenciando. Os estados ainda revelaram a total leniência em abrir os olhos para identificar o caos que se avizinhava e que se instalou em nossas vidas.
No Brasil, o resultado foi a decretação da situação de calamidade pública pelo governo federal. No âmbito estadual e municipal, foram editados decretos com a determinação do isolamento social e o fechamento quase que integral de todos os segmentos da economia, atingindo o comércio, a indústria e o setor de serviços.
Segundo dados levantados pela Confederação Nacional de Serviços (CNS), o lockdown causará na economia um prejuízo estimado em mais de 320 bilhões de reais, além de uma retração no PIB na ordem de 6,5%, impacto bastante significativo para uma economia que já está patinando há uma década.
Apesar dos efeitos econômicos, não se tem dúvida quanto à necessidade do isolamento e do acerto nas medidas recomendadas pelas autoridades médicas e sanitárias, que estão reproduzindo no Brasil os mesmos protocolos recomendados pela OMS e que já são adotados por outros países quase que à unanimidade. A questão passa a ser qual o impacto dessa crise para a relação tributária envolvendo o fisco e o contribuinte, pois a retomada da economia ou a sua estagnação passa necessariamente por medidas que possam ajustar essa relação, equilibrando o desejo arrecadatório do estado e a pretensão do contribuinte de receber benefícios fiscais.
Já é perceptível que a desaceleração brutal da economia terá como efeito imediato a diminuição bastante significativa da arrecadação tributária de todos os entes federativos.
Além disso, para enfrentar o problema da pandemia nesse curto espaço de tempo em que os hospitais já estão superlotados de pacientes, o Brasil precisará de mais receitas e, dentro desse contexto, já nascem no Congresso Nacional propostas para a criação do Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) e até mesmo de um Empréstimo Compulsório. Ao que parece, tais propostas não se revelam adequadas, pois a criação desses tributos no momento conturbado em que vivemos pode ter como efeito a fuga de capitais e o aprofundamento do cenário de recessão.
Por outro lado, aumentar a arrecadação a partir dos tributos já existentes esbarra na carga tributária já bastante elevada que compromete a competitividade de nossa economia e que ameaça a capacidade financeira dos contribuintes. Como efeito desse “lockdown”, diversos agentes econômicos simplesmente deixarão de existir ou, num cenário melhor, sairão dessa crise com estatura ou estrutura reduzida ao mínimo existencial. Isso, sem falar, numa camada da população que será empurrada para a miséria e que deixarão a condição de contribuinte para assumir a posição de beneficiários das políticas públicas de assistência social.
As despesas com a pandemia e com a criação da infraestrutura necessária para combater o “corona vírus” deve ser financiada a partir do endividamento do estado, que deve assumir a sua responsabilidade pela situação imprevisível que estamos vivenciando.
O tributo pode e deve ser usado como um instrumento para alavancar a saída da crise e dar o “start” no combate à recessão. Mas para isso, é preciso que os governos federal, estadual e municipal não se limitem apenas a pacotes assistencialistas, devendo cada um adotar medidas macro econômicas que sejam capazes de auxiliar o empreendedor na retomada de sua atividade.
Dentre as medidas que se impõem, o governo deve postergar o prazo para pagamento de todos os tributos, o que deve incluir todos os impostos e as contribuições especiais, impedindo que a tributação possa comprimir ainda mais o caixa dos contribuintes. Nesse momento, apenas o governo federal vem adotando medidas para postergar o recolhimento dos tributos, enquanto estados e municípios adotam medidas ainda muito tímidas e insuficientes.
Outra medida que se revela apropriada para esse momento seria afastar as penalidades por impossibilidade de cumprimento de acordo nos parcelamentos. Como nos últimos anos foram criados parcelamentos bastante generosos com elevado índice de adesão, muitos contribuintes possuem parte da sua receita comprometida com esses pagamentos, o que, diante desse novo cenário, ficarão impossibilitados de cumpri-los. Como essa inadimplência decorrerá de força maior e não de má-fé, importante o governo se antecipar e conceder anistia quanto às penalidades e estender a prorrogação de pagamentos também para esses parcelamentos, além de descontos na contabilização de juros e de correção monetária.
Poderiam ser adotadas medidas ainda mais agressivas, como, a liberação dos depósitos judiciais efetuados como garantia de pagamento de créditos tributários em execuções fiscais e em ações anulatórias, mediante, é claro, a substituição por outra garantia, como bem imóvel.
O que se quer demonstrar é que o direito tributário tem meios adequados para ajudar o enfrentamento dessa situação. O uso de medidas adequadas, tempestivas e na intensidade correta permitirá o combate a recessão e ao desemprego. Nesse momento, menos tributo significará maior proteção à economia.
Antônio Claudio Portella – Professor e Mestre em Direito Tributário